sábado, 13 de outubro de 2012

Variantes Regionais Diatópicas


Uma experiência minha com adolescentes, em sala de aula.
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Objetivos

Este trabalho tem a intenção de, através de análise das variantes regionais assistidas, do estudo do contexto histórico/geográfico contido nelas e (re)produção de alguns desses muitos falares da língua portuguesa do Brasil, construir a valorização à diversidade lingüística. Também é oportunidade de desfazer a ideia de que há apenas uma forma correta de se comunicar, em detrimento das demais manifestações orais, tão comumente desprestigiadas, marginalizadas.

Trabalhar as variantes regionais permite levar o jovem estudante a

• Conhecer a rica diversidade linguística geográfica (variação diatópica), com seus sotaques bem marcados, a fim de contribuir para a identidade nacional;
• Perceber o preconceito decorrente do valor social que é atribuído aos diferentes modos de falar, a fim de construir o respeito às variantes linguísticas regionais e à diversidade cultural do país;
• Ultrapassar as formas cotidianas de produção oral, a fim de aprimorar a competência discursiva, apropriando-se dos diversos falares do Brasil.

Público-alvo/Perfil

Destina-se a alunos do oitavo ano do EF-II. São, costumeiramente, turmas heterogêneas que abrigam alguns alunos cuja dificuldade com a leitura e escrita sugere a exploração da oralidade. Outra característica peculiar dessas turmas é o fato de serem, muitos dos alunos, filhos de migrantes, sobretudo nordestinos ou do interior, para quem a própria cultura ainda parece ser objeto de discriminação.

Pressuposto teórico

Koch (1997, apud Vieira, 2011, p.1) aponta que fala e escrita estão entrelaçadas, mas com complexidades diferentes. Seriam duas modalidades distintas de comunicação, cada qual com suas características peculiares. E sugere que se viesse a trabalhar a construção do sentido na oralidade, lançando um novo olhar sobre a maneira de se trabalhar a língua na sala de aula, não tratando as duas modalidades como independentes, mas, ao contrário, inter-relacionando-as.

O entrelaçamento de que trata Kock permite que nos concentremos na modalidade oral, através de algumas de suas variantes, como uma espécie de compensação para tantos anos de silenciamento escolar das manifestações orais, sobretudo as de menor prestígio.

Relevância

A audição, a análise e representação das variantes regionais brasileiras garantem, além da percepção estética mais apurada, a construção do respeito às diferenças lingüísticas, base de aproximação sócio/cultural.

Procedimentos

1. Iniciar uma conversa com os alunos com as seguintes indagações: Qual forma de falar vocês consideram a correta, em nosso país? Por quê? E a fala de quem vem de outro lugar é errada? Será que os povos brasileiros de outras regiões pensam o mesmo de nossa fala? Espera-se que alguns manifestem curiosidade ou conhecimento prévio sobre o assunto.

2. Com equipamento multimídia, apresentar-lhes o vídeo ‘Na roça é diferente’, HQ de Maurício de Souza, procurando chamar a atenção para as diferentes características sociais de Chico Bento e seu primo da cidade, inclusive no que diz respeito à rotina, ao ritmo de vida de ambos, associando-as às nuanças linguísticas de cada um. Pode-se indagar sobre qual das falas tem mais prestígio social e por quê.

3. Com o mesmo equipamento, assistir ao vídeo ‘Um violeiro toca’, de Almir Sater, buscando congruências com o vídeo anterior, bem como as sutis variantes lingüísticas que os tornam diferentes, consideradas as distâncias geográficas. Levar à percepção de que são falares caipiras de ‘roças’ diferentes. Contextualizados geográfica-historicamente, pode-se apontar que muitos dos falares de nosso país são de comunidades comunicativas que pouco escrevem, mas que produzem muito na oralidade.

4. Com um terceiro vídeo, de Nelson Freitas, trazer um comparativo bem humorado das variações regionais, ilustrando a riqueza lingüística. Esse vídeo oportuniza comentários acerca da origem histórica de alguns desses sotaques e, também, da identidade social. Além disso, é momento adequado para, de maneira superficial, compreender como ocorrem as diferenças de articulação fonética e prosódica.

5. Introduzir um debate sobre respeito às diferenças. É de muito valor ouvir depoimentos dos alunos de ascendência nordestina ou do interior paulista, que poderão contribuir para o enriquecimento do debate. Essa prática enseja a manifestação oral dos alunos, promovendo interação (falar, mas ouvir).

6. Procurar reunir, na lousa, as informações consideradas relevantes, pedindo que anotem, em seus cadernos, a síntese da discussão. Essa síntese deverá ser transcrita, como comentário sob o último dos vídeos apresentados, disponível para ser revisto em um blog institucional, ou do professor. Caberá ao professor a análise e avaliação.

7. A devolutiva das postagens poderá ocorrer com uma conversa sobre a etapa anterior, através da oralização espontânea de todos em sala, acerca do que havia sido disponibilizado no blog, devidamente mediada pelo professor.

8. Um último vídeo ‘Preconceito linguístico’ retoma um questionamento: Será que há unidade lingüística no país? Há uma forma correta e outras erradas de se falar? Pretende-se que cheguem à conclusão de que são muitas as variantes, portanto, não há unidade. E que isso é muito bom.

9. Por fim, os alunos deverão, encerrando as discussões, formar pequenos grupos de cinco ou seis, a fim de preparar e produzir (em data marcada) uma representação teatral, com duração de cinco minutos, que mescle dois falares, ou mais, cuja temática seja ‘a diversidade e o respeito às variantes’. Essa atividade deverá ser mediada com especial cuidado, a fim de conservar a deferência devida aos falares.

Referências bibliográficas

a. SOUZA, Maurício de. Na roça é diferente. Post do Youtube. Disponível em http://www.youtube.com/watch?v=X588TuX1Wv0&feature=related, acesso em 28/05/2011.
b. SATER, Almir. Um violeiro toca. Post do Youtube, por André Lemos. Disponível em http://www.youtube.com/watch?v=JhRdKFyO-mQ, acesso em 28/05/2011.
c. UPUPAWAYANDBEYOND. Preconceito linguístico. Post do Youtube. Disponível em http://www.youtube.com/watch?v=VkywM4GNvjs&feature=fvwrel, acesso em 28/05/2011.
d. FREITAS, Nelson. Como elogiar uma mulher. Post do Youtube, por Alex13885. Disponível em http://www.youtube.com/watch?v=qktE3rQNxbM&feature=related, acesso em 28/05/2011.
e. KOCH, I. V. O texto e a construção dos sentidos. São Paulo: Editora Contexto, 1997.
f. VIEIRA, D. V. Exposição oral se aprende na escola. Dissertação para pós-graduação/Unicamp, 2011.